A onicomicose, ou simplesmente infecção das unhas causada por fungos (também denominada paroníquia e tinea unguium), é umas das micoses superficiais mais comuns em todo o mundo. É a onicopatia que corresponde à aproximadamente metade das queixas em consultórios de dermatologia1 e, em escala global, apresenta prevalência estimada de 5,5 a 10% na população geral,2,3 sendo responsável por cerca de 90% dos casos de infecção nas unhas dos pés4. A ocorrência da onicomicose é consideravelmente crescente com a idade e é particularmente comum em idosos. Fatores que predispõem à infecção incluem diabetes, psoríase, trauma persistente na unha, má circulação sanguínea, tabagismo, fatores genéticos, ambientes úmidos, uso constante de calçados apertados ou fechados, HIV e agentes imunossupressores. Geralmente ocorrem concomitantemente ou após a infecção fúngica dos pés (tinea pedis).5
As manifestações clínicas são variadas e descritas de acordo com o tipo de invasão no tecido ungueal, caracterizando-se principalmente por descoloração (cor amarelada ou esbranquiçada) e espessamento da unha, muitas vezes acompanhados por onicólise (separação da unha do leito ungueal) e possivelmente afetando a pele adjacente. As formas mais graves causam cavitação e onicocriptose (unha encravada) até a completa fragmentação das unhas5. Embora a onicomicose não seja associada a casos de alta mortalidade, é uma doença de difícil tratamento e de alta recorrência (10-53%),5 podendo ocasionar desconforto, dor, limitações físicas e ocupacionais, além de afetar diretamente na qualidade de vida dos indivíduos acometidos.5,6 Os agentes etiológicos das onicomicoses incluem os dermatófitos, as leveduras e os fungos filamentosos não dermatófitos (FFNDs). A maioria das infecções é causada por dermatófitos, predominantemente Trichophyton rubrum , seguido por T. mentagrophytes .
Outras infecções cada vez mais comuns envolvem a ação de FFNDs, tais como espécies de Aspergillus, Fusarium, Acremonium, Neoscytalidium e Scopulariopsis brevicaulis , além de leveduras Candida albicans e C. parapsilosis .1,5 Nas últimas décadas, estudos científicos destacam o aumento de onicomicoses por FFNDs como causa isolada desses distúrbios ou em infecções mistas com os dermatófitos, que vem contribuindo para a crescente resistência antifúngica relatada.1,5,7
No entanto, os casos de onicomicose por FFNDs ainda são subestimados e muitas vezes diagnosticados incorretamente por avaliação clínica e exames micológicos clássicos, quando realizados, pois são considerados principalmente fungos contaminantes.
Neste sentido, torna-se primordial a identificação específica do(s) fungo(s), em decorrência das diferenças nas condutas terapêuticas apropriadas e principalmente pela presença de fungos resistentes aos antifúngicos de uso convencional, como a terbinafina e os azólicos.
O diagnóstico clínico de onicomicose requer a confirmação por métodos laboratoriais, que geralmente incluem como padrão-ouro a microscopia direta com solução de hidróxido de potássio (KOH) e /ou cultura a partir do raspado da lesão ungueal, adequadamente coletado. No entanto, a detecção de elementos fúngicos pelo exame direto com KOH pode apresentar de 5-20% de resultados falso-negativos, enquanto a sensibilidade dos métodos de cultura pode variar de 30 a 57%.2,5,8,9 Estudos demonstram que cerca de 35% dos casos podem ter culturas negativas mesmo após uma microscopia direta positiva.10,11 O crescimento dos fungos em cultura apresenta tempo variável, dependendo do fungo e dos meios de cultivo empregados, ou seja, 48-72 horas para leveduras e até 3-4 semanas para os FFNDs e dermatófitos.5,10
Em casos de suspeita de onicomicose por FFNDs, a cultura sequencial em pelo menos dois tempos diferentes com intervalos de aproximadamente 4 semanas é recomendada para confirmar a detecção de fungos filamentosos como agente causal e não contaminantes ambientais.12
Outros métodos diagnósticos complementares incluem: histopatologia, ensaios de amplificação do DNA, testes de imunocromatografia, citometria de fluxo e espectrometria de massas.5,10 Dentre os métodos de amplificação do DNA, a reação em cadeia da polimerase (PCR) convencional e a PCR em tempo real trouxeram grandes benefícios em função da possibilidade de identificação de diferentes fungos em nível de gênero e espécie a partir de alvos moleculares específicos, além da análise pelo sequenciamento do DNA, com maior sensibilidade e especificidade, assim como menor tempo para a confirmação do diagnóstico definitivo. É particularmente útil quando há suspeita de FFNDs ou de infecção mista e recomendado em combinação com os exames micológicos tradicionais.7-10
Finalmente, as abordagens para o manejo da onicomicose devem envolver o diagnóstico laboratorial preciso antes de iniciar o tratamento, evitando assim os efeitos adversos dos antifúngicos sistêmicos, como a toxicidade para o fígado e os rins, além das interações medicamentosas indesejadas.
Devido à natureza multifatorial da onicomicose, mudanças comportamentais relacionadas ao estilo de vida, condições ambientais e desinfecção dos calçados e outros acessórios podem prevenir a propagação e manutenção de reservatórios do fungo, contribuindo para a redução das taxas de recorrência dessa micose,5,12 que ainda permanece como um grande desafio para a saúde pública mundial.
Bibliografia. As referências bibliográficas serão enviadas, quando solicitadas.