O Brasil está preparado para uma Nova Epidemia?

Em entrevista exclusiva ao Labornews, Ester Sabino, cientista brasileira reconhecida mundialmente por liderar equipe que sequenciou o genoma do vírus Sars-CoV-2, conta sobre suas pesquisas
atuais, a iminência de novas epidemias ou pandemias e como o Brasil pode se preparar.

Ester Cerdeira Sabino, formada em medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, é professora titular do Departamento de Patologia da mesma instituição. Fez Doutorado em imunologia (FMUSP), com período sanduíche na Universidade da Califórnia (EUA), Livre Docência (FMUSP) e Pós-Doutorado pelo Irwin Memorial Blood Centers, IMBC, Estados Unidos. Também é professora da Universidade Municipal de São Caetano do Sul e consultora no Instituto Todos pela Saúde. Membro da Academia Brasileira de Ciência e investigadora principal de dois programas do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos. Suas principais linhas de pesquisa são: segurança transfusional, HIV, doença de Chagas, vírus emergentes, anemia falciforme, microbioma, agentes transmissíveis pelo sangue e Sars-CoV-2.
Em sua homenagem, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e a Academia de Ciências de São Paulo criaram o Prêmio Ester Sabino para Mulheres Cientistas do Estado de São Paulo.
Ester recebeu a Medalha Armando de Salles Oliveira, concedida pela USP, por sua liderança no sequenciamento do genoma do novo Coronavírus no Brasil/2024; foi premiada pela TWAS (The World Academy of Sciences for advancement of science in developing countries), uma organização ligada à UNESCO, denominada ‘2026 TWAS Award in Medical & Health Sciences’. O prêmio foi concedido em reconhecimento às suas “ilustres contribuições para o entendimento da história natural da doença de Chagas, epidemias virais e segurança transfusional”. (dividido com Bushra Ateeq, da Índia)

A senhora está envolvida com alguma pesquisa atualmente?
“Eu tenho dois projetos do NIH ( National Institute of Health), um em
doença de Chagas e outro em anemia falciforme. Além disso, coparticipo de um estudo relacionado à disfunção imunológica, cuja investigadora principal é a professora Magda Carneiro, contribuindo, também, na pesquisa dela sobre doenças raras.

A COVID veio para ficar? Será tão presente em nossas vidas como a influenza?
Sim, a covid veio para ficar. Existem quatro outros vírus que são primos do SARS-CoV-2, todos eles causam infecções rotineiras na população humana, convivendo conosco há muitos anos, o último entrou na nossa espécie há uns 200 anos. O que a gente está vendo agora é a entrada de um novo vírus que já se adaptou à nossa espécie.
Como está a pesquisa sobre a gripe aviária no país? Ela chegará aqui?
Existem pesquisadores comprometidos com a gripe aviária. Eu não estou seguindo isso tão de perto, mas seguramente é uma área que deve ser mantida em vigilância e é muito importante. Principalmente agora que já surgiram casos, por exemplo, no México, onde recentemente morreu uma criança de 3 anos com H5N1.

Será que não estamos dando a devida importância a febre Oropouche?
A febre do Oropouche está se espalhando e é difícil controlar! É muito difícil controlar essa mosquinha que transmite o vírus e temos que prestar bastante atenção, pois é uma doença que também pode ser grave que causa, por exemplo, problemas na gestação.

Estamos próximos de uma nova epidemia ou pandemia?
Nós acreditamos que deva acontecer uma nova pandemia, principalmente com vírus respiratórios, que é a pior pandemia, uma vez que a transmissão é muito rápida. Mas quando isso vai acontecer, não se sabe. Acho que a K5N1 tem grande chance, mas isso ainda não aconteceu de forma sistemática. Estamos vendo casos esporádicos e esse último, no México, lembra da possibilidade desse vírus se adaptar e ser transmitido com rapidez. Em algum momento, esses vírus vão acabar conseguindo brigar, quebrar as barreiras e, como o Sars-CoV-2, se adaptar à nossa espécie.

O Brasil está preparado para um novo evento pandêmico?
O Brasil está melhor preparado, mas ainda falta bastante. Precisamos investir em instituições sejam organizadas para isso, com foco em inteligência, produzindo e transmitindo dados para a população e para o Ministério da Saúde. Isso é muito necessário e um precioso acréscimo nosso sistema único de saúde que, por si só, já facilita muito a resposta a uma pandemia. Alguns países já têm instituições capazes de coordenar o processo e, assim, detectar os possíveis casos de epidemia mais rápido.

Como você avalia a ciência no país, atualmente, e as pesquisas na área de saúde?
Em relação às pesquisas no país, houve um grande avanço. Percebo que existiu realmente um esforço, no governo atual, em alocar mais recursos para pesquisas e inovações na área da saúde, o que acho louvável. Uma pesquisa depende de recursos constantes, certo? É muito importante que não tenha altos e baixos. Porque não adianta a gente correr com uma pesquisa e ter que parar, sem concluir, por falta de recursos. Então, é preciso que se consiga desenvolver pesquisas de forma forte e duradoura.

Os setores público e privado (principalmente Fiocruz e Butantã) estão atentos e se preparando para novas epidemias?
Percebo que existe uma vontade de todos os grupos nesse sentido. Vale a pena ver o Instituto Todos Pela Saúde como proposta para uma nova instituição de inteligência, que coordene os processos para agilizar a identificação e o controle das epidemias. O Instituto Todos Pela Saúde tem o apoio do Itaú – mais informações podem ser acessadas pelo site. Esses movimentos são muito importantes para que a gente se prepare. E sim, o Butantã está criando várias novas vacinas, a Fiocruz, da mesma forma, está gerando pesquisas, criando estratégias para controlar possíveis novas epidemias, com novos testes diagnósticos e, também, com novas vacinas.