Andrea Penna – Jornalista
A inteligência artificial traz enxurrada de novidades e muitos desafios, inclusive éticos. A IA é a grande protagonista de 2023 para as empresas de medicina diagnóstica, e os laboratórios precisarão dela em alta escala, analisam os diretores da SBPC/ML, SBAC e ABRAMED, entidades do setor.
Para André Mario Doi, Médico Patologista Clínico, Diretor Científico da SBPC/ML e Coordenador Médico do Setor de Biologia Molecular do Laboratório do Hospital Israelita Albert Einstein e Denise Sousa Campos, Médica Patologista Clínica do Setor de Imunologia e BigData do Hospital Israelita Albert Einstein, a inteligência artificial é uma grande novidade que poderá ser incorporada na medicina diagnóstica, mas com cautela: ” ChatGPT pode ser aplicado em diversos campos e setores, como atendimento ao cliente, assistência virtual, geração de conteúdo, tradução automática, educação e muitos outros. No entanto, é importante ressaltar que o ChatGPT é uma ferramenta de inteligência artificial e, portanto, pode ter limitações e imprecisões. É essencial usá-lo com cautela e verificar a precisão e a relevância das informações geradas”. Eles avaliam que “O ChatGPT pode ser aplicado na medicina laboratorial para auxiliar na interpretação de resultados de exames, fornecer informações sobre diagnósticos, agilizar processos de comunicação entre profissionais da saúde e pacientes, além de atuar como uma ferramenta educacional para profissionais em treinamento”, e que os principais benefícios incluem a melhoria da eficiência, a redução de erros humanos, a rapidez na interpretação de resultados, o fornecimento de informações atualizadas e a promoção de um atendimento mais personalizado aos pacientes.
Doi e Souza Campos lembram, no entanto, que existem desafios éticos e de privacidade relacionados ao uso do ChatGPT na medicina laboratorial: “é necessário considerar questões como privacidade e segurança dos dados dos pacientes, garantir que as informações fornecidas pela ferramenta sejam precisas e atualizadas e evitar a dependência excessiva dos profissionais de saúde em relação à tecnologia”. Eles também enfatizam que o ChatGPT nao pode substituir completamente os profissionais da saúde no laboratório, pois “o ChatGPT é uma ferramenta de apoio que pode melhorar a eficiência e a qualidade do trabalho dos profissionais da saúde, mas não substitui a experiência, o julgamento clínico e a empatia que os profissionais oferecem aos pacientes. A ferramenta deve ser usada como um complemento às práticas já existentes. Uma delas, segundo eles, é que a ferramenta ChatGPT pode analisar os resultados de exames e fornecer informações relevantes, como a faixa de normalidade para os valores obtidos, possíveis causas para alterações e sugestões de exames adicionais que possam ser necessários para um diagnóstico mais preciso. Já para auxiliar na tomada de decisões clínicas em medicina laboratorial, o ChatGPT pode fornecer informações e sugestões baseadas em dados e pesquisas científicas atualizadas, mas a decisão final sempre deve ser tomada pelos profissionais da saúde, levando em consideração o contexto clínico específico de cada paciente.
Já Milva Pagano, diretora-executiva da Abramed, ressalta que os avanços tecnológicos, o aumento do envelhecimento populacional, e a crescente preocupação com a saúde e o bem-estar tendem a impulsionar o setor de medicina diagnóstica no Brasil e no mundo. “Entre os desafios a serem superados, podemos considerar a existência de infraestrutura, recursos tecnológicos e humanos capacitados para lidar com o contínuo aumento da demanda. Também deverá ser solucionado o acesso a exames laboratoriais e de imagem, que têm trazido avanços proporcionando o cuidado personalizado, gerando economia para o sistema de saúde e benefícios diretos aos pacientes”. Ela também aborda a inteligência artificial como um fator de destaque no setor a partir desse ano: “Em 2023, esperamos ver um aumento na utilização de tecnologias de inteligência artificial (IA) em todas as áreas da medicina diagnóstica, o que pode trazer benefícios significativos para os pacientes, como aumento da precisão e rapidez dos diagnósticos. No entanto, também devemos estar atentos aos desafios potenciais da IA, como a necessidade de supervisão e regulamentação adequada para garantir a precisão dos resultados e a segurança dos pacientes. Pagano ainda lembra que a telessaúde também tem se tornado cada vez mais popular, permitindo que os pacientes tenham acesso a cuidados de saúde, o que amplia o acesso das pessoas a exames de diagnóstico, principalmente em áreas remotas. Outra tendência é o crescimento da medicina personalizada, que se baseia no uso de dados genéticos e outros marcadores para personalizar o tratamento e os diagnósticos para cada paciente individualmente. Isso pode levar a melhores desfechos e reduzidos efeitos colaterais.
Para o Tesoureiro Adjunto da Diretoria da SBAC, Jorge Terrão, a inteligência artificial é incontestável no setor de analises clinicas, embora não esteja ainda consolidado. “Vai ajudar muito, substituindo um trabalho manual e que exige muito tempo nos laboratórios, como por exemplo, a liberação de exames. A IA nos permitirá fazer liberações automáticas, principalmente n os médios e grandes laboratórios, que tem o desafio de liberar uma quantidade muito grande de exames, o que demanda m muita mão de obra. A IA também pode auxiliar em outro aspecto, que é o de criar algoritmos, separando os exames dentro dos valores de referência, ditos normais, e por exemplo, destacando aqueles que exigem uma dedicação maior para avaliação dos profissionais de laboratório”.
Terrão conta que em um evento do qual participou em São Paulo, a IA era mostrada na hematologia, na realização de um hemograma. “A máquina não vai substituir o ser humano, mas ali os exames fora dos parâmetros eram apartados para um parecer mais aprofundado. Isso será de grande valia para os laboratórios, uma vez que vai ajudar a dedicar mais tempo para aqueles procedimentos para as amostras daqueles pacientes que realmente precisam de uma atenção diferenciada, mas acredito que com o tempo os laboratórios vão desenvolver outras finalidades interessantes para a inteligência artificial. ”
Terrão, no entanto, chama a atenção para lidar com problemas, por exemplo, no caso da criação de algoritmos, ele diz que ao mesmo tempo que pode simplificar processos, esses algoritmos vão causar perfis e teremos de estar atentos para avaliá-los continuamente. Afinal, como costumo avisar aos meus alunos, em medicina nem sempre um mais um é igual a dois. Temos de dominar a tecnologia e não ser dominado por ela”.
Ele revela outra preocupação, com a Lei Geral de Proteção de Dados. “A área de saúde lida com muito dado extremamente critico, sensível. A IA é, ao meu ver, um caminhão sem volta, pois assistimos no setor uma imensa movimentação com incorporações e fusões, além da trica de informações entre esses e os laboratórios médios e pequenos. Eu posso estar aqui olhando uma célula e compartilhar uma análise com alguém nos EUA, China ou na Europa, por exemplo, solicitado uma segunda opinião”.
“Outro aspecto relevante da IA é a criação de conteúdos de comunicação. Como vou me relacionar com o cliente médico, com o paciente, com o plano de saúde. Enfim, temos uma ferramenta poderosa na mão, que são nossos bancos de dados, mas tudo será mudado a partir de 2023. Os funcionários sairão da passividade para a busca ativa, por exemplo, para facilitar o paciente acessar todo o seu histórico”.