A pandemia provocada pelo novo coronavírus devastou sistemas de saúde, economia, educação, produção industrial, serviços etc., mas esse tipo de fenômeno por si só provoca uma revolução nos negócios e no modo de vida e aciona sinais de alerta para que se mobilize esforços destinados ao desenvolvimento de planos de prevenção e enfrentamento de novos problemas. O aprimoramento da tecnologia para a saúde, a Inteligência Artificial (IA), a robótica, o desenvolvimento de novas drogas e até os modelos de atuação dos profissionais de saúde são apenas alguns exemplos que devem ser altamente impactados nos próximos anos.
Neste cenário, muitas novidades devem surgir em congressos médicos, feiras de tecnologia em saúde, como a Hospitalar, e outros eventos científicos e de negócios em geral. No ano passado, o SindHosp-Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo entrevistou 139 hospitais privados – a maioria, 80%, no interior paulista – para mapear a experiência com atendimento à distância durante o período de quarentena. Mais de um quinto dos hospitais ouvidos, 22%, iniciaram o serviço de telemedicina a partir da pandemia, principalmente nos prontos socorros, e 78% aprimoraram o serviço de telemedicina em especial nos ambulatórios. Outros 76% intencionavam ampliar as teleconsultas e 88% pretendiam ampliar o telemonitoramento de pacientes crônicos.
No ano passado, a OMS-Organização Mundial de Saúde divulgou o relatório “Ethics and governance of artificial inteligente for health” (Ética e governança da inteligência artificial para a saúde), que consumiu 18 meses de consultas junto a um grupo de especialistas internacionais. O trabalho aponta desafios e riscos éticos em relação à utilização da IA na saúde e lista seis princípios de consenso para garantir que a IA funcione em benefício público de todos os países. O documento está disponível para download em https://www.who.int/publications/i/item/9789240029200).
Essas mudanças certamente aconteceriam e já estavam sendo gestadas, mas foram aceleradas em decorrência das dificuldades que emergiram mais fortemente com a pandemia e isso será positivo para as instituições de saúde, profissionais, pacientes, porém o processo de transição exigirá muito esforço e investimento.
A Forbes apontou recentemente cinco tendências para a saúde. A primeira delas é a conveniência para pacientes que buscam experiências otimizadas digitalmente que possibilitam facilidades como check-in online ao dar entrada numa unidade de saúde, agendamento de compromissos por aplicativos, acesso remoto ao consultório médico, dentre outras. Um estudo mostrou que essa conveniência faz tanta diferença que quase metade das pessoas entrevistadas poderia mudar de médico para ter esses serviços.
A segunda tendência é a telemedicina que foi incrementada durante a pandemia: relatório da McKinsey & Company, do ano passado, mostrou que o uso de telemedicina aumentou 38 vezes em relação ao período pré-COVID-19.
O terceiro item é a IA e a análise preditiva para avaliar a probabilidade de um resultado futuro com base em padrões observados em dados históricos de um paciente. Várias são as vantagens que vão desde o posicionamento do médico à frente de possíveis ocorrências de doenças até a possibilidade de monitorar riscos de quadros complexos e tratamentos dispendiosos para o paciente.
Em quarto lugar vêm os softwares de análise de imagens que agregarão valor ao universo das imagens de alta resolução, como raios-X, tomografia computadorizada e ressonância magnética. A IA trabalhará para auxiliar profissionais a decifrar grandes quantidades de exames e identificar melhor doenças específicas.
A última tendência é a revolução alimentada pela IA, considerando que as organizações em geral e também as de saúde, hoje, vivenciam o que se chama de “explosão de dados” que precisam ser gerenciados. E isso seguirá crescendo exponencialmente. A IA poderá padronizar dados médicos, independentemente do formato, automatizar tarefas, reduzir desperdício, carga administrativa e, então, deixar ao homem ações que valorizem o potencial do capital humano.
Como toda revolução, esta precisará também de investimentos em capacitação, debates e desenvolvimento de políticas que atendam às questões éticas, mudanças no modelo de formação universitária e técnica e esforço conjunto entre público e privado, pesquisadores e profissionais da ponta, governos e sociedade civil para desenvolver estratégias que levem efetivamente os avanços que a tecnologia disponibiliza à população que acessa serviços privados, medicina suplementar e também àquela que depende essencialmente do SUS, no Brasil, e serviços públicos no mundo.É imprescindível a formação de grupos multidisciplinares para discutir o planejamento de sistemas que atendam às peculiaridades das diversas realidades brasileiras e no mundo, bem como a regulamentação do uso da tecnologia de forma que atenda a todos os princípios dos direitos individuais e coletivos. A sociedade civil se mostrou ágil no Brasil com o surgimento da pandemia a ponto de ser difícil imaginar o tamanho do desastre sem os recursos financeiros, humanos e estratégicos de empresários, voluntários e organizações em geral. Agora é preciso que autoridades, em todas as instâncias, mobilizem esta força que se mostrou efetiva – pesquisadores, empresários, ONGs etc. – para um amplo debate a fim de preparar o país para os próximos anos.