Vitor Muniz Jr. – Liderança Global com Raízes Brasileiras

Aos 48 anos, com sólida trajetória de seis anos na Roche Diagnóstica — sucedendo sua atuação na América Latina —, o brasileiro Vitor Muniz Jr. se firmou como Referência Internacional em Medicina Diagnóstica. Há dois anos no continente africano com base no Quênia, lidera iniciativas estratégicas que abrangem todo o portfólio de diagnóstico: Core Lab, Biologia Molecular, Patologia e NPC, integrados por Soluções Digitais.

Sua capacidade de unir inovação técnica à sensibilidade para necessidades locais o torna um nome de impacto global, sem perder o contato com o setor laboratorial brasileiro.

Nesta entrevista ao Labornews, Vitor fala sobre avanços do setor, desafios comuns a mercados emergentes e o papel da liderança técnica na transformação da saúde. Entre tecnologia, gestão e propósito, Vitor compartilha uma visão que inspira cooperação global e eleva os Diagnósticos.

• Entre culturas e diagnósticos

Você atua há dois anos no continente africano, liderando iniciativas estratégicas em diagnóstico. O que mais o marcou nessa experiência — em termos técnicos, humanos e culturais?

“A experiência mais marcante, especialmente nos últimos dois anos na África, é a escala do desafio exigido para impactar cerca de 1.6 bilhão de pessoas, a dimensão que abrange esta etapa da minha trajetória na Roche. Tecnicamente, isso exige a excelência nas nossas áreas de clientes — Core Lab, Biologia Molecular, Patologia e NPC — atuando através das Soluções Digitais e garantindo uma Experiência Superior para o Paciente.
Do ponto de vista humano e cultural, o que me move é o propósito de expandir o acesso ao modelo de tratamento da doença atual, ao mesmo tempo desafiando o status quo atual, migrando para o modelo de saúde e bem-estar. Meu maior aprendizado, em 34 anos de carreira, é que a tecnologia só tem valor se transforma a vida das pessoas impulsionando o progresso social. Nossa missão é trazer conhecimento científico que engaje a pessoa a ser protagonista de sua própria saúde, atacando as doenças de maior fardo societal.”

• A ciência no contexto local

Como a vivência na África ampliou sua percepção sobre o papel do diagnóstico em regiões com diferentes realidades sociais e de infraestrutura?

“Minha percepção foi transformada para enxergar o diagnóstico como a estratégia de saúde pública mais eficiente e um catalisador de equidade. Na África, o foco é a estratégia de polarização e conexão que a imagem ilustra: ter a Biologia Molecular e o Core Lab em laboratórios de referência, garantindo o máximo de eficiência e testes integrados usando o Near Patient Care (NPC), para levar o rastreamento primário para a ‘última milha’ – os testes são realizados no local ou perto do paciente.
Essa abordagem de portfólio completo nos permite potencializar os resultados, atendendo à urgência e complexidade das necessidades de uma população de 1.6 bilhão de pessoas com recursos limitados. O diagnóstico é o pilar que transforma recursos em resultados concretos para a Experiência do Paciente.”

• Oncologia e imuno-histoquímica

A atuação em imuno-histoquímica e diagnóstico oncológico tem ganhado força nos mercados emergentes. Quais desafios específicos você enfrentou e quais lições essa jornada deixou?

“O principal desafio no diagnóstico oncológico é a disparidade trágica nas taxas de sobrevida, manifestada pelas diferentes estruturas econômicas e/ou produtivas. Enquanto em países de alta renda a sobrevida de 5 anos para câncer de mama excede 90%, na África subsaariana esse número cai para 40%.

Essa discrepância é impulsionada pela ausência de diagnóstico precoce e de acesso a tratamento personalizado.

Para combater isso, a Imuno-Histoquímica (IHC) é um pilar insubstituível da Patologia. Tivemos que superar a escassez de patologistas (menos de 4 por milhão) e a fragilidade logística do tecido (amostra) a ser analisado. A lição fundamental é que a tecnologia deve compensar a carência humana. Conquistamos resultados sólidos (como o crescimento de +22,9% em Patologia no H1) ao focar na IHC para uma precisa subtipagem tumoral e investir em Soluções Digitais para mitigar as barreiras de expertise, integrando o resultado com a Biologia Molecular.”

• Patologia digital e inovação

De que maneira a patologia digital tem contribuído para reduzir desigualdades de acesso a diagnósticos de precisão? O que ainda precisa avançar para tornar essa tecnologia mais acessível?

“A Patologia Digital é o principal vetor para reduzir as desigualdades geográficas e o déficit de patologistas. Na África, ela atua como um equalizador ao digitalizar a lâmina e permitir a Telepatologia, conectando um caso em um hospital remoto a um patologista no centro de referência. Isso é crucial para impactar positivamente nas taxas de sobrevida.
Para avançar na acessibilidade é preciso focar na resiliência digital e no desenvolvimento de habilidades: as soluções precisam ser robustas para funcionar onde a eletricidade e a internet são intermitentes, e o treinamento remoto deve ser uma prioridade. A Patologia Digital é a camada de Soluções Digitais que complementa a Biologia Molecular, tornando a precisão acessível.”

• Desafios compartilhados

Quais são, em sua avaliação, os principais pontos de convergência entre os desafios enfrentados pelos setores laboratoriais do Brasil e da África?

“A convergência mais crítica é a luta pela sustentabilidade ao acesso e à qualidade em escala para populações vastas. Em ambos contextos, precisamos:

* Gerenciar a Logística e a Qualidade: Manter a estabilidade e a qualidade dos testes moleculares, bem como do transporte das amostras para o Core Lab em territórios vastos.

* Integrar Soluções Descentralizadas e de Referência: Fazer com que o Near Patient Care (NPC) funcione como uma extensão conectada do sistema de diagnóstico, que inclui Patologia e Biologia Molecular.

* Enfrentar o Fardo Societal das Doenças Críticas: Focar os recursos de Soluções Digitais e Biologia Molecular na prevenção e detecção precoce das doenças de maior impacto social, sempre com a Experiência do Paciente no centro.”

• O papel das grandes indústrias

Como as grandes empresas do setor de diagnóstico podem contribuir de forma mais efetiva para a sustentabilidade e o desenvolvimento dos sistemas de saúde nos países em desenvolvimento?

“O papel da indústria transcende a venda de equipamentos. Ele se baseia na parceria estratégica de longo prazo e em uma visão 10x de impacto, não apenas de lucro, mas de efeito transformador. Isso significa:

* Desenvolvimento de Capacidade Local (Capacity Building): Não basta vender a solução; é preciso transferir conhecimento de Core Lab, Biologia Molecular e Patologia Digital, formando a próxima geração de líderes.

* Modelos Financeiros de Acesso: Criar modelos de custo flexíveis, como o Global Access Program (GAP) gerenciado por nós, que viabilizem grandes projetos de saúde pública.

* Inovação Adaptada: Fornecer soluções robustas que exijam menos manutenção, adaptadas às realidades locais, garantindo que nossos quatro pilares (Core Lab, Molecular, Patologia, NPC) sejam sustentáveis.”

• O cenário brasileiro

Ao acompanhar o mercado brasileiro mesmo à distância, quais avanços e oportunidades você enxerga hoje no setor de medicina diagnóstica nacional?

“O Brasil é uma referência em inovação e escala, impulsionado pela maturidade do setor privado. O maior avanço é a digitalização acelerada e a busca por eficiência no Core Lab.

As oportunidades que vejo são as diretamente ligadas à minha experiência de General Management:

* Medicina de Precisão Populacional: Alavancar a expertise em Biologia Molecular e o volume de dados do Brasil para se tornar um hub global em genômica.

* O Diagnóstico como Solução de Gestão: Utilizar nossas Soluções Digitais para extrair Real World Data e fornecer insights preditivos para a gestão populacional, desafiando o status quo do modelo reativo de tratamento (sick-care) e otimizando o uso de recursos. O Brasil tem o potencial de elevar a Experiência do Paciente em um nível de escala inédito.”

• Liderança técnica e propósito

O que define, para você, uma liderança técnica moderna no campo da saúde? Que valores e atitudes consideram essenciais para inspirar equipes em contextos tão diversos?

“Uma liderança técnica moderna precisa conseguir ser Arquiteto de Soluções e, também, Catalisador de Propósito. Foquei meus esforços nesse sentido, como executivo estratégico e prático e, por 26 anos em IVD, entendendo o P&L (mais de $100MM que gerenciei) e os desafios do Core Lab. Me aprofundei no entendimento sobre a missão 10x de impactar 2.3 bilhões
de pessoas na minha trajetória profissional.

Valores essenciais para inspirar:

* Propósito Centrado na Ação: Usar a ciência para inspirar a saúde proativa, desafiando o status quo do modelo reativo de tratamento e conectando o trabalho da equipe à ‘história da estrela-do-mar’: o impacto para aquele indivíduo.

* Mentalidade Global, Impacto Individual: Aplicar os padrões de excelência global, mas nunca perder de vista que o crescimento de +30,5% no Core Lab significa que mais vidas foram salvas.

* Visão de Legado (Talentos): Focar em desenvolver a próxima geração de líderes, garantindo que o conhecimento em Biologia Molecular e Soluções Digitais seja sustentável, perpetuando o propósito de transformar vidas.”

• Inteligência artificial e futuro do diagnóstico

De que forma as tecnologias emergentes — como IA, automação e integração de dados — estão redesenhando o papel dos profissionais de diagnóstico? O que deve mudar nos próximos cinco anos?

“A IA e a Automação são as ferramentas que habilitam nossa missão 10x para o acesso, liberando a capacidade humana para o que é mais valioso: a interpretação e a consultoria. A automação total do Core Lab e a IA na Patologia Digital assumem a triagem e as tarefas repetitivas.

O profissional, nos próximos cinco anos, será um Integrador de Insights: aquele que conecta os dados do Core Lab, da Patologia Digital e interpreta os resultados de testes moleculares e integrados. A integração digital será completa, e a IA se tornará o ‘copiloto’ da decisão clínica, permitindo que o profissional se concentre em gestão populacional e medicina de precisão, sempre com foco na Experiência do Paciente.”

• Legado e visão de futuro

Se pudesse inspirar uma única mudança duradoura no setor de diagnóstico, qual seria — e por que ela é importante para o futuro da medicina laboratorial?

“Eu gostaria de inspirar a descentralização do acesso através da excelência diagnóstica e conectada.

Essa é a mudança mais importante, pois o futuro da medicina laboratorial é equitativo. Se o diagnóstico é a base da saúde, ele deve ser acessível a todos. Isso significa garantir a precisão da Biologia Molecular e a eficiência do Core Lab, ao mesmo tempo em que se utiliza o NPC e as Soluções Digitais como pontes para as comunidades. Esse modelo garante que o diagnóstico de ponta — que pode ser a diferença entre uma sobrevida de 33% e 90% em casos de câncer — alcance as 2.3 bilhões de pessoas que representamos em nossa trajetória (0.7 bilhão na América Latina + 1.6 bilhão na África), cumprindo nosso propósito de impactar vidas em escala e garantindo que, de fato, ‘o local onde uma pessoa vive não determine se ela sobrevive.’